terça-feira, 25 de maio de 2010

Pensar é Transgredir por Lya Luft

Não lembro em que momento percebi que viver deveria ser uma permanente reinvenção de nós mesmos — para não morrermos soterrados na poeira da banalidade embora pareça que ainda estamos vivos.
Mas compreendi, num lampejo: então é isso, então é assim. Apesar dos medos, convém não ser demais fútil nem demais acomodada. Algumas vezes é preciso pegar o touro pelos chifres, mergulhar para depois ver o que acontece: porque a vida não tem de ser sorvida como uma taça que se esvazia, mas como o jarro que se renova a cada gole bebido.
Para reinventar-se é preciso pensar: isso aprendi muito cedo.
Apalpar, no nevoeiro de quem somos, algo que pareça uma essência: isso, mais ou menos, sou eu. Isso é o que eu queria ser, acredito ser, quero me tornar ou já fui. Muita inquietação por baixo das águas do cotidiano. Mais cômodo seria ficar com o travesseiro sobre a cabeça e adotar o lema reconfortante: "Parar pra pensar, nem pensar!"
O problema é que quando menos se espera ele chega, o sorrateiro pensamento que nos faz parar. Pode ser no meio do shopping, no trânsito, na frente da tevê ou do computador. Simplesmente escovando os dentes. Ou na hora do desafeto, do rancor, da lamúria, da hesitação e da resignação.
Sem ter programado, a gente pára pra pensar.
Pode ser um susto: como espiar de um berçário confortável para um corredor com mil possibilidades. Cada porta, uma escolha. Muitas vão se abrir para um nada ou para algum absurdo. Outras, para um jardim de promessas. Alguma, para a noite além da cerca. Hora de tirar os disfarces, aposentar as máscaras e reavaliar: reavaliar-se.
Pensar pede audácia, pois refletir é transgredir a ordem do superficial que nos pressiona tanto.
Somos demasiado frívolos: buscamos o atordoamento das mil distrações, corremos de um lado a outro achando que somos grandes cumpridores de tarefas. Quando o primeiro dever seria de vez em quando parar e analisar: quem a gente é, o que fazemos com a nossa vida, o tempo, os amores. E com as obrigações também, é claro, pois não temos sempre cinco anos de idade, quando a prioridade absoluta é dormir abraçado no urso de pelúcia e prosseguir, no sono, o sonho que afinal nessa idade ainda é a vida.
Mas pensar não é apenas a ameaça de enfrentar a alma no espelho: é sair para as varandas de si mesmo e olhar em torno, e quem sabe finalmente respirar.
Compreender: somos inquilinos de algo bem maior do que o nosso pequeno segredo individual. É o poderoso ciclo da existência. Nele todos os desastres e toda a beleza têm significado como fases de um processo.
Se nos escondermos num canto escuro abafando nossos questionamentos, não escutaremos o rumor do vento nas árvores do mundo. Nem compreenderemos que o prato das inevitáveis perdas pode pesar menos do que o dos possíveis ganhos.
Os ganhos ou os danos dependem da perspectiva e possibilidades de quem vai tecendo a sua história. O mundo em si não tem sentido sem o nosso olhar que lhe atribui identidade, sem o nosso pensamento que lhe confere alguma ordem.
Viver, como talvez morrer, é recriar-se: a vida não está aí apenas para ser suportada nem vivida, mas elaborada. Eventualmente reprogramada. Conscientemente executada. Muitas vezes, ousada.
Parece fácil: "escrever a respeito das coisas é fácil", já me disseram. Eu sei. Mas não é preciso realizar nada de espetacular, nem desejar nada excepcional. Não é preciso nem mesmo ser brilhante, importante, admirado.
Para viver de verdade, pensando e repensando a existência, para que ela valha a pena, é preciso ser amado; e amar; e amar-se. Ter esperança; qualquer esperança.
Questionar o que nos é imposto, sem rebeldias insensatas mas sem demasiada sensatez. Saborear o bom, mas aqui e ali enfrentar o ruim. Suportar sem se submeter, aceitar sem se humilhar, entregar-se sem renunciar a si mesmo e à possível dignidade.
Sonhar, porque se desistimos disso apaga-se a última claridade e nada mais valerá a pena. Escapar, na liberdade do pensamento, desse espírito de manada que trabalha obstinadamente para nos enquadrar, seja lá no que for.
E que o mínimo que a gente faça seja, a cada momento, o melhor que afinal se conseguiu fazer.

domingo, 2 de maio de 2010

Brasil- O eterno 1° de abril

http://www.youtube.com/watch?v=NvhO93OMycg


["Aprovado o salário mínimo de cinco mil reais",
"Agora o brasileiro se aposenta com trinta anos de idade",
"Eleito o primeiro presidente negro dos EUA",
"Políticos do Brasil são os mais honestos do mundo",
"Pesquisas revelam que a televisão é o meio de comunicação mais educativo para as crianças",
"Estudos comprovaram que fumar faz bem para a saúde",
"E álcool fortalece o fígado"]


Veja como o mundo é mentiroso e traiçoeiro,
Abusam da sua fé.
O Brasil tá sempre em 1º lugar.
A propaganda diz que alcool é bom e que é legal fumar!
Será que é hoje que eu vou ganhar na loto?
Andar de moto, mais seguro se cair
E não quebrar os ossos.
O Maluf falou que não tem grana na Suíça,
E a gente acredita (aham!)

''- Não fiz plástica, nasci assim bonita!''
Diz a modelo da capa da revista.
''- Eu jogo por amor à camisa.''
Diz o futebolista,
Então me dá a grana e fica só com a sua camisa!
Gstaram milhões de pesquisa e a AIDS foi banida.
Na África enfim, chegou o progresso.
Os africanos agora são empresários de sucesso.
Paulista parou de falar mal de carioca,
porque agora carioca gosta de paulista.
Saiu no jornal seu nome numa lista
Você ganhou uma casa com piscina,
Carro zero na garagem que já vem com motorista.

Que compensação que nada,
Eu te amo de verdade,
O povo se ajuda porque ama a caridade.
O Pinóchio só falava a verdade nunca
contou uma mentira, nem cometeu sequer um embute.
Ele não parece com o Clinton ou o George Bush,
Tá tudo perfeito no mundo, acabou o lodo.
O caloteiro paga o sogro,
O vagabundo tá de emprego novo.
A TV é o tesouro do povo,
A riqueza da gente,
Quanto programa inteligente de domingo à tarde.
É tanta cultura, somente pura arte,
Que o povo nem precisa mais de faculdade.

''-Compre meu carnê e eu te dou um mihão.''
Coloca silicone, vira a nova sensação.
Nunca mais vai comprar nada à prestação,
nem mesmo os presentes de natal.
[Fenomenal!]
O carnaval é a festa do povo,
Tem a ver com tradição,
Não tem nada de imoral,
Gringo vem porque gosta, não é turismo sexual,
Gente pelada é apenas um traço cultural.

Claro que é!
O traço cultural de um povo extrovertido.
É muito educativo,
Principalmente pra sua filha e pro seu filho.
Cê num acha?
- Pô! Lógico que é! Fala a verdade!
Num é legal? Ô!
Aquele monte de gente bêbada, pelada,
Atropelando e sendo atropelada na estrada, uuh!



''- A história do homem é cheia de glórias.
Os negros são prósperos, só existem vitórias.
Não há a necessidade de um messias
Nem de um salvador!
O Homo sapiens salvará a si mesmo do caos.''